Filme conta história real de judeus escondidos em Berlim durante Holocausto
Crítica | Por Thiago Mendes
thiagomendes@portaltelenoticias.com
(Foto: divulgação)
Neste primeiro longa-metragem do alemão Claus Räfle, estamos diante de mais um episódio verídico ocorrido durante a ocupação nazista na Europa, particularmente ao longo da Segunda Guerra Mundial - de longe, o momento histórico mais retratado pelo cinema (leia as críticas de ‘13 Minutos’ e ‘A Viagem de Fanny’).
Falamos, aqui, da sistemática deportação dos mais de 100 mil judeus que viviam em Berlim no início da década de 1940. Por deportação, lembremos, entenda-se o deslocamento forçado aos fatídicos campos de concentração. Cerca de 7 mil permaneceram ilegalmente na capital alemã, vivendo às escondidas. Ao final da guerra, menos de 2 mil sobreviveriam. ‘Os Invisíveis’ acompanha quatro desses remanescentes durante os anos mais sombrios de suas vidas.
(Foto: divulgação)
Räfle, diretor e corroteirista (ao lado da argentina Alejandra López), não abre mão de sua larga experiência como documentarista televisivo, estruturando seu filme a partir dos depoimentos de Cioma Schönhaus, Eugen Friede, Hanni Lévy e Ruth Arndt, personagens reais que sobreviveram ao período, cujas histórias são representadas pelo quarteto principal do elenco. Desta forma, sequências ficcionalizadas são intercaladas por trechos das entrevistas que os verdadeiros protagonistas concederam aos produtores, cerca de oito anos atrás.
O problema é que Räfle parece insistir demais em reafirmar a veracidade dos fatos que seu filme conta. Para ele, inserir planos cotidianos e paisagens filmadas na própria época em que a história se passa não é o suficiente para reforçar essa ideia. A frequência com que as entrevistas surgem na tela prejudica a fluidez do enredo. Por mais autênticos, reveladores e comoventes que os depoimentos se mostrem, é como se fôssemos interrompidos a cada vez que começamos a imergir na trama.
A maneira como as transições entre um formato e outro se dá também não ajuda. A alternância da narração, passando da voz dos entrevistados para a dos atores causa estranhamento contínuo. Melhor seria apenas a voz dos reais sobreviventes, sem acréscimos. Da mesma forma, a última frase proferida em cada cena ficcionalizada, sendo repetida logo em seguida, no início do trecho documental, é de uma redundância absurda.
(Foto: divulgação)
No fim das contas, vamos nos forçando a acostumar com o padrão estabelecido por Räfle, embora a fruição não se torne totalmente cômoda. Talvez seja um efeito proposital buscado pelo diretor: negar ao espectador o conforto de uma imersão mais profunda como um jeito de relembrar, a cada interrupção das cenas, a gravidade do tema e dos acontecimentos retratados.
Esse excesso de didatismo, que Räfle parece carregar de sua longa trajetória na TV, incomoda o apreciador do bom cinema. Vivemos, no entanto, tempos de intolerância e ódio exacerbados em todo o mundo, o que torna desejável - até mesmo necessário - esse exagero pedagógico que ‘Os Invisíveis’ carrega ao relatar os fatos.
Ainda há quem afirme que o Holocausto não existiu (tal qual aqueles para quem ditaduras não foram opressoras). Em vez de respondê-los com ironia ou rispidez, por que não pegá-los pela mão, como crianças que necessitam de formação adequada, e ensiná-los com calma e paciência o que realmente se passou? Sobretudo quando não notamos nas palavras desses sobreviventes, em momento algum, sentimentos como mágoa ou rancor. Vemos, de fato, pessoas que, assim como a Alemanha em geral, não têm vergonha em admitir e encarar a realidade de seus passados, mas que buscam, ao contrário, permanente reconciliação com suas histórias. Exemplo a ser seguido.
Veja o trailer:
Os Invisíveis (Die Unsichtbaren) - Alemanha, 110 min, 2017
Dir.: Claus Räfle - Estreou em 04/10.
As opiniões expressas nessa coluna são de inteira responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a opinião do Portal Telenotícias.
Crítica | Por Thiago Mendes
thiagomendes@portaltelenoticias.com
(Foto: divulgação)
Cerca de 7 mil judeus permaneceram escondidos em Berlim durante a Segunda Guerra; menos de 2 mil sobreviveram |
Neste primeiro longa-metragem do alemão Claus Räfle, estamos diante de mais um episódio verídico ocorrido durante a ocupação nazista na Europa, particularmente ao longo da Segunda Guerra Mundial - de longe, o momento histórico mais retratado pelo cinema (leia as críticas de ‘13 Minutos’ e ‘A Viagem de Fanny’).
Falamos, aqui, da sistemática deportação dos mais de 100 mil judeus que viviam em Berlim no início da década de 1940. Por deportação, lembremos, entenda-se o deslocamento forçado aos fatídicos campos de concentração. Cerca de 7 mil permaneceram ilegalmente na capital alemã, vivendo às escondidas. Ao final da guerra, menos de 2 mil sobreviveriam. ‘Os Invisíveis’ acompanha quatro desses remanescentes durante os anos mais sombrios de suas vidas.
(Foto: divulgação)
Ellen (Victoria Schulz) e Ruth (Ruby O. Fee) se passam por viúvas de guerra para não serem identificadas como judias |
O problema é que Räfle parece insistir demais em reafirmar a veracidade dos fatos que seu filme conta. Para ele, inserir planos cotidianos e paisagens filmadas na própria época em que a história se passa não é o suficiente para reforçar essa ideia. A frequência com que as entrevistas surgem na tela prejudica a fluidez do enredo. Por mais autênticos, reveladores e comoventes que os depoimentos se mostrem, é como se fôssemos interrompidos a cada vez que começamos a imergir na trama.
A maneira como as transições entre um formato e outro se dá também não ajuda. A alternância da narração, passando da voz dos entrevistados para a dos atores causa estranhamento contínuo. Melhor seria apenas a voz dos reais sobreviventes, sem acréscimos. Da mesma forma, a última frase proferida em cada cena ficcionalizada, sendo repetida logo em seguida, no início do trecho documental, é de uma redundância absurda.
(Foto: divulgação)
Eugen (Aaron Altaras, último à direita) é um dos quatro personagens reais que protagonizam 'Os Invisíveis' |
Esse excesso de didatismo, que Räfle parece carregar de sua longa trajetória na TV, incomoda o apreciador do bom cinema. Vivemos, no entanto, tempos de intolerância e ódio exacerbados em todo o mundo, o que torna desejável - até mesmo necessário - esse exagero pedagógico que ‘Os Invisíveis’ carrega ao relatar os fatos.
Ainda há quem afirme que o Holocausto não existiu (tal qual aqueles para quem ditaduras não foram opressoras). Em vez de respondê-los com ironia ou rispidez, por que não pegá-los pela mão, como crianças que necessitam de formação adequada, e ensiná-los com calma e paciência o que realmente se passou? Sobretudo quando não notamos nas palavras desses sobreviventes, em momento algum, sentimentos como mágoa ou rancor. Vemos, de fato, pessoas que, assim como a Alemanha em geral, não têm vergonha em admitir e encarar a realidade de seus passados, mas que buscam, ao contrário, permanente reconciliação com suas histórias. Exemplo a ser seguido.
Veja o trailer:
Dir.: Claus Räfle - Estreou em 04/10.
As opiniões expressas nessa coluna são de inteira responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a opinião do Portal Telenotícias.
Excesso didático de ‘Os Invisíveis’ é bem-vindo em tempos de intolerância
Reviewed by Thiago S. Mendes
on
10/05/2018 07:17:00 AM
Rating:
Nenhum comentário
Fale com a redação: contato@portaltelenoticias.com